No dia 30 de Abril de 1970, estava eu farto de aguardar a ordem de avançar para a Alemanha, depois de ter preenchido todos os requisitos que me foram exigidos, incluindo uma ida à sede da PIDE, no Porto, para verificação do meu código de conduta. A minha avozinha estava muito doente e já me tinha sussurrado a frase que sempre repetia aos netos, quando estes partiam para a guerra ou para longe dela, vais embora e nunca mais voltarei a ver-te!
Já o tinha ouvido, quando fui para a Marinha e repetido, duas vezes, quando parti para a guerra, em Moçambique. Felizmente, sempre regressei a casa, são e salvo, para lhe dizer que estava enganada. Mas desta vez ela acertou no seu vaticínio, mas foi ela a ceder à doença e partir para sempre. Ainda a acompanhei ao cemitério, antes de partir para Lisboa e tomar lugar num comboio cheio de emigrantes que o Salazar enviava para a República Federal da Alemanha, ao abrigo de um acordo celebrado para fornecer mão-de-obra a quem dela precisava e que por aqui era excedentária, nessa altura.
Ainda hoje não consegui descobrir que caminho tomou esse comboio que mal se encontrou em solo francês, rumou a Leste, como fizeram uns anos antes, os comboios carregados de prisioneiros a caminho das câmaras de gás dos nazis de Hitler. Imagino que tenha entrado na Alemanha, na zona de Estrasburgo, pois pouco tempo depois do controlo fronteiriço, de que nos apercebemos pela presença d polícia de ambos os países, já seguíamos para norte numa linha férrea que seguia a par do rio Reno. O destino final era Colónia e lá chegamos algumas horas depois.
Eu já levava quase dois anos de vida civil, abandonara a Marinha, no dia 20 de Maio de 1968, já me casara e tinha uma filha, primeira bisneta da minha avó que ela gostava de segurar no seu colo. Também já tivera o meu primeiro emprego na Indústria de Cordoaria que abandonei ao fim de 13 meses por perceber que ali não tinha qualquer futuro.
E já tinha vivido um mês inteirinho, na Bélgica, tentando embarcar na Marinha Mercante, mas um cunhado meu que trabalhava na Alemanha, apareceu-me um dia em Antuérpia e carregou comigo para fora dali, dizendo que era uma grande asneira embarcar nessa situação. Para mim era uma aventura que eu gostaria de ter vivido, mas compreendo que a família recém-formada também merecia a minha atenção.
Uma revoada de lembranças me traz esta data, mas a mais marcante é, de facto, a partida da minha avó para a eternidade. Ela sofreu muito, nos últimos anos de vida e morrer acho que foi uma libertação para ela. O cancro da mama (exposto) estava a comê-la viva e nunca fez qualquer cirurgia ou tratamento que lhe mitigasse as dores. Era a minha mãe, sua filha única, que lhe fazia os curativos, seguindo os conselhos de um velho médico de aldeia que acompanhava a nossa família. Posso dizer que foi um alívio para todos, quando finalmente fechou os olhos e se foi para sempre, pois já ninguém aguentava vê-la sofrer tanto.
Ela foi sempre tão dedicada à família, criou todos os seus 12 netos e ainda alguns dos seus bisnetos e sofreu tanto com a sua doença que Deus só pode tê-la num lugar especial. Os meus pensamentos estão, hoje, com ela!
Todos nós temos uma estrelinha no céu que brilha mais do que as outras, zelando por nós...
ResponderEliminarParece que o meu comment fugiu... :(
ResponderEliminarJanita
Já foi tratado!!!
EliminarBom dia
ResponderEliminarEste texto mexeu comigo amigo e comoveu-me profundamente.
Um abraço.
JR
Obrigado pela partilha!
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