domingo, 21 de fevereiro de 2021

Recordações!


O meu pai já morreu, há perto de 20 anos, mas hoje lembrei-me dele. Porquê? Porque hoje é domingo, dia de ir à missa, de manhã, e à reza, de tarde. Essas eram as ordens que havia lá em casa, quando eu era ainda uma criança. Desde pequeno, a minha mãe vestia-me, calçava-me e punha-me a andar à sua frente a caminho da igreja. Eu sonhava crescer depressa para fugir daquela obrigação.

O meu pai, por razões profissionais, viveu mais de metade da sua vida longe de nós, mas quando estava em casa também me obrigava a ir à igreja, sítio de onde eu fugia a sete pés sempre que podia. Por volta dos meus 9 anos, comecei a sentir vergonha de estar na missa junto da minha mãe e de todas as outras mulheres da aldeia. Os homens ficam ao fundo da igreja, perto da porta de saída (por razões óbvias) e os rapazes gostavam de se juntar a eles. E fazer o que eles faziam que era passar mais tempo fora que dentro da igreja. Então, durante a homilia era certo e sabido que a maioria estava no adro na paródia. Alguns havia que saíam depois do sinal da cruz e regressavam quando o padre dizia - Ite missa est - e dava a bênção, antes de regressarem a casa e aos seus afazeres.

Aos domingos à tarde era dia de liberdade e além de ir à reza não havia mais obrigações. Depois do almoço, lá procurava os meus amigos com quem passava a tarde na brincadeira e muitas vezes, na hora de ir para a igreja, perguntava um - vais à reza? - e os mais malandrecos diziam sempre que não. Com o tempo, resolvi arriscar e um dia disse - também não vou!

Quando cheguei a casa, o meu pai que, excepcionalmente, tinha estado presente e acompanhado a minha mãe à igreja, perguntou: - foste à reza? Fui, respondi eu muito rápido e sem hesitar. Então, diz-me lá de que cor estava o padre vestido? Comecei logo a gaguejar e ele percebeu que a tarde tinha sido passada na brincadeira e de rezas nem uma simples Ave Maria.

O meu pai raras vezes me pôs a mão no pelo, principalmente, devido às suas longas ausências, mas não media a força que tinha e quando batia era para aleijar. Vivi poucos anos com ele, primeiro foi ele que em busca de trabalho, andou sempre longe de casa, depois fui eu a abandonar o ninho, primeiro para ir estudar, depois para me alistar na Marinha. Depois da Marinha casei-me e desertei, de vez, do lar paterno. De vez em quando, lembro-me dele e das muitas coisas boas que fez por mim. E isso faz esquecer a meia dúzia de tabefes (merecidos) que ele me deu!

1 comentário:

  1. Gostei destas recordações.
    Meu pai nunca me bateu. Que me lembre a única que apanhou do pai, oi a minha irmã e uma única vez.
    mas da minha mãe levei muitas. Diria até que poucos seriam os dias em que ela "não me molhava a sopa". Como se dizia na época. Ou porque eu fazia asneira e estava a dar maus exemplos aos mais novos, ou eles as faziam porque eu não tomava conta deles, ou porque ela estava chateada com o meu pai e me mandava dizer--lhe o que queria para não ter de falar com ele e eu respondia-lhe que não era moça de recados, enfim, havia sempre um motivo.
    Abraço, saúde e boa semana

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