domingo, 17 de março de 2024

Falar de quê?

 Estava aqui a carregar no botão para ligar esta maquineta que me põe em contacto convosco e ia pensando, de que vais falar, hoje? Que assunto podes abordar que interesse a quem te visita? Pensa bem, pois nas últimas publicações poucas moscas poisaram!

Mal se iluminou o monitor, logo recebo um recado da Microsoft (como eu embirro com esta gente que está sempre de olho em tudo o que eu faço!) lembrando-me que o Peniche - um camarada da Marinha muito especial - tem uma ligação especial a esta data e por isso devia dedicar-lhe um pensamento também especial.

Como, hoje ao fim da tarde, joga o Benfica, eu tinha planeado dedicar-lhe a minha mensagem deste domingo que é o último de inverno, embora a Primavera não nos dê ainda quaisquer sinais de que vem a caminho. Mas estava um pouco hesitante, pois o meu seguidor mais assíduo, não lhe refiro o nome, mas sei que ele sabe de quem estou a falar, é sportinguista de coração, nascido na mais alta colina do lado norte de Lisboa e poderia não apreciar a minha escolha.


Assim, aceitei a proposta do amigo Bill Gates e vou dizer duas palavras a respeito do meu camarada de armas, Domingos Belo, a quem a malta toda ainda trata por Peniche, em honra da terra de onde ele saiu para ingressar na Fragata D. Fernando E Glória, quando era ainda um chevalito que não obedecia aos pais.

O destino de todos os rapazes da Fragata era ficar ali presos até fazer 18 anos e ter aprendido uma profissão que lhe garantisse a sobrevivência futura. Ou, em alternativa, ingressar na Marinha de Guerra, logo que tivessem ultrapassado os 16 anos de idade. Foi o caminho seguido pelo Domingos que assim se tornou meu camarada e amigo para a vida. Ele chegou a Vale de Zebro um dia antes de mim, em 9 de Março de 1962, por mero acaso o dia em que eu completei os meus 18 anos.

Quem me acompanha há muitos anos sabe de quem eu falo, pois o tenho referido várias vezes. Nos almoços-convívio que eu vinha organizando, ano após ano, tive o prazer de o ver aparecer, em 2010, no Pôr do Sol, restaurante de Montemor-o-Novo. Ele era tão popular na Marinha que mal apareceu foi a estrela da festa. Todos queriam falar com ele, tirar uma foto ao seu lado e perguntar-lhe o que tinha feito, desde que nos deixara em Lourenço Marques, recambiado para a Metrópole, antes de tempo por razões disciplinares.

De regresso a Lisboa, ele desertou da Marina de Guerra e ingressou na de Pesca do Bacalhau, partindo para o Canadá, onde ficou e se casou, depois da primeira campanha. Numa vinda a Portugal foi preso, por conta da sua deserção, e foi obrigado a completar o Serviço Militar, no Exército. E quis o destino que o colocassem no quartel da Póvoa, vila de pescadores como a sua natal Peniche que é onde eu vivo.

Um certo dia, ia eu pela minha rua abaixo, concentrado nos meus pensamentos e vejo aproximar-se um militar com as divisas de Cabo, nos ombros. Ao cruzar-se comigo, deitei-lhe um olhar de relance e quase caía de quatro ao reconhecer as feições do meu "amigo de Peniche". Lá me contou as suas aventuras, desde que saiu da CF2, em 1963 ou princípio de 1964 (não sei a data ao certo) até aquele dia em que ficamos no meio da rua palrando como papagaios.

Para não tornar esta leitura cansativa, pois o assunto só a ele e a mim desperta grande interesse e daria para encher muitas páginas, refiro que ele ainda vive no Canadá, na costa oeste e se dedicou ao comércio de bacalhau e mariscos. A sua empresa chegou a ter um tamanho considerável e era bem conhecida em todo o Canadá. «Captain Belo´s Seafood» assim se chamava ela e chegou a ter uma filial aberta nas Finanças de Peniche, mas que nunca chegou à prática. Como muitos outros projectos do Domingos que era um sonhador, ficou pelo caminho. O seu plano era fazer a cura do bacalhau, na China (por causa do preço) e depois importá-lo para Portugal através dessa filial. Soube que ele foi para a China, depois do nosso encontro em Montemor, mas algo deve ter corrido mal que lhe deu cabo dos planos.

A última vez que tive o prazer de falar com ele foi por telefone e andava ele ocupado em vender a sua empresa. E depois disso desapareceu-me da frente como se se tivesse evaporado. Como se dizia na Marinha, ele foi sempre um "graneleiro" de primeira e toda a sua vida foi um granel pegado: Desde o casamento, aos filhos, à empresa, sem esquecer a sua vida militar, toda a sua vida rimava com granel, feito à pressa e sem deixar grande rasto, logo que desaparecia.

E pronto, está cumprido o meu dever para hoje!

5 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Recordar é viver. Hoje, esta mosquinha, que ainda não está morta e todos os dias aqui pousa, sem no entanto, emitir zumbido algum, porque se não revê nos últimos escritos, já vai zumbir que: a saudade anda morta por falar... eheheheh
    Bom domingo!

    PS- eliminei o outro pois a mosquinha parecia morta, uma vez que nem apareceu.

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    1. Eu compreendo isso, as minhas publicações não são nada ajustadas ao "belo sexo".

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  3. Conheci alguns da fragata. Bons camaradas mas tal como eu nao nasceram para a vida militar... Excelente texto, excelente historia.

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    1. No meu recrutamento entraram 6 ou 7 fragatas, 3 dos quais foram comigo para Vale de Zebro, os outros seguiram para a Escola de Alunos. A parte engraçada é todos os 3 fuzileiros foram comigo para Moçambique, na Companhia 2 e o Peniche é o único que resta vivo (tanto quanto me é dado saber).

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