Santar é (ou era até 2012) uma freguesia do concelho de Nelas, muito famosa pelas suas construções em granito, já foi vila, nos velhos tempos, deram-lhe até o nome de Vila Jardim. Mas, hoje em dia, é conhecida mundialmente por ser a produtora dos melhores, entre os melhores vinhos do Dão. A «Casa de Santar» e a sua adega estão no roteiro turístico de todas as agências de viagens que organizam visitas e provas de vinhos nos períodos de férias. O vinho, nem vos vou falar dele, o melhor é passarem por uma garrafeira e levarem uma garrafa para poderem fazer o vosso juízo. Desde 3.50€ para o corrente e 8 a 9€ para um Reserva, estes são os preços mais baratos, depois é sempre a subir.
Mas não é essa a história que vos quero contar. As últimas conversas sobre vinhos fizeram-me lembrar de uma história antiga que envolve 3 fuzileiros e três raparigas de Santar. Eles estavam na Escola de Alunos Marinheiros e sem futuro à vista, quando começou a Guerra Colonial. Elas estavam em Santar, todas solteirinhas e boas raparigas à espera de noivo que as levasse ao altar.
Em Setembro de 1961, abriu a Escola de Fuzileiros, em Vale de Zebro, e saiu à ordem que podiam concorrer ao quadro todos os que preenchessem as condições, desde grumete a sargento. Esses três amigos, com o posto de Marinheiro, combinaram concorrer e foram admitidos no Curso de Conversão que começou em Março do ano seguinte. Aliás, um deles preferiu fazer o Curso de Fuzleiro Especial, talvez convencido que teria garantida uma promoção antes dos outros. O facto é que antes de terminar o ano de 1962 já tinham ingressado no quadro de fuzileiros e colocaram-lhe nos ombros as divisas de Cabo.
Em Setembro desse mesmo ano começa a formar-se a CF2 e os dois que fizeram o curso de conversão inscreveram-se e seguiram, de imediato, para Moçambique. Aquele que fez o curso de especial seguiu, uns meses mais tarde para Angola. Em meados de 1964, foi-lhes transmitida ordem de regresso à Escola para frequentarem o Curso de Sargentos. Depois de terminado o curso com aproveitamento, sentiram que o seu futuro estava garantido, era só esperar pelas divisas de sargento e gozar a vida. Com a idade a aproximar-se dos 30, acharam que estava na hora de procurar noiva para se casarem.
Aqui, falha-me a história, pois estava em Moçambique quando aconteceu o casamento, mas o facto é que um deles cruzou-se com as três irmãs de Santar, uma delas deitou-lhe o laço e em três tempos marcaram o casamento. Até porque a hipótese de voltar para o Ultramar estava em cima da mesa e podia acontecer em qualquer momento. Como é fácil de compreender, os três amigos juntaram-se, em Santar, por causa do casamento. As duas irmãs da noiva que continuavam descomprometidas, aproveitaram a oportunidade de laçar aqueles dois marinheiros, bem aperaltados nas suas fardas brancas e, como já devem estar a adivinhar, acabaram por casar também.
Uma delas ficou viúva, há mais de 20 anos, mas continua a viver em Santar, com as duas irmãs e os dois cunhados. Eles e elas foram a África várias vezes, até acontecer a independência das colónias e, depois disso, ficaram a viver nas redondezas da Escola ou da Base, conforme o lugar para onde iam destacados. Só depois da reforma resolveram regressar à terra que viu nascer as suas mulheres e aí construíram casa para passar o resto dos seus dias. Eles fazem 80 anos, neste corrente ano, e acredito que nos últimos 20 devem ter emborcado umas valentes botelhas daquela pomada de que vos tenho vindo a falar. Quero, por isso, acreditar que são dois "felizes fuzileiros".
Fuzileiro uma vez, fuzileiro para sempre!