domingo, 3 de junho de 2018

Ai, os meus ricos tomates!


Conseguem imaginar um homem de meia idade, com uma perna só, apoiando-se numa muleta, daquelas de enfiar debaixo da axila que lhe substitui, às mil maravilhas, a perna que lhe falta, junto a uma banca de frescos no mercado e gritando a plenos pulmões:
- Quem quer os meus tomates? Pode apalpar, freguesa, que eu não me importo! Ninguém, aqui no mercado, tem uns tomates como os meus!
Esqueci-me de acrescentar, na apresentação que fiz desta figura caricata, que ele era gay e não tinha um pingo de vergonha na cara. E não havia ninguém que levasse a mal as suas brincadeiras e os pregões pouco usuais que gritava aos quatro ventos para tentar vender a sua mercadoria.
Caminhava melhor com a sua muleta do que eu o faço com as duas pernas, corria até, quando era preciso. Se alguém o chateava e não o podia alcançar, atirava-lhe com a muleta e depois corria, aos pulinhos, até a alcançar de novo. Em sua defesa pessoal, manejava-a com destreza como qualquer minhoto no jogo do pau. Nesses casos, quando alguém entrava no gozo com ele, normalmente por causa das suas mariquices, era mais seguro não se aproximar muito.
Talvez por causa da muleta, nunca usava casaco, preferia vestir um par de calças, com a perna direita cortada acima do joelho, e uma camisola, mais fina no verão e mais grossa no inverno. Num jeito de bicha assumida, costumava bater com as costas da mão direita na palma da mão esquerda, dizendo:
- Só camisolas tenho 19.
Enfim, uma figura típica da minha terra que já morreu faz uns anos. Até o mercado perdeu parte da sua graça, quando se deixou de se ouvir a sua voz apregoando os seus tomates, os melhores e mais bonitos da praça que todas as freguesas eram convidadas a apalpar.
Lembrei-me desta história ao olhar para os tomares (ou tomateiros) que estavam, ontem, à venda na feira de Estremoz. Nas minhas contas já deviam ter sido plantados, há algum tempo, assim tão altos vão vergar a cabeça até ao chão, quando forem plantados. Mas isso é um problema de quem os comprar, a mim não me aflige.

3 comentários:

  1. Lembro-me muito bem das quatro figuras típicas da Figueira, só um está vivo, mas todos sentimos a sua falta para alegrar as ruas, no verão com os passeios cheios de turistas de repente ouvia-se gritar, (fujam olha a vaca)! O homem devia ser bruxo e lá via de vez em quando o que outros não viam.
    Esse teu conterrâneo vendedor de tomateiros provocava os maridos das freguesas, tinha que meter a moleta em acção.
    Bom domingo

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  2. Esse teu conterrâneo só com uma perna corria mais do que alguns com as duas. Um cego disse para mim! Sou cego dum olho e vejo mais do que tu?
    como assim perguntei eu! Respondeu ele só com olho vejo os teus dois olhos. Enquanto que tu com os teus dois olhos em mim só consegues ver um olho!

    Para comer e apalpar,
    todo o ano há tomates
    tomateiros para plantar
    há quem diga disparates!

    Bom domingo, coçando neles?

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