Comecei a ler as notícias, mas desisti pouco depois. Só falam do Sporting e da bronca arranjada pelo Bruno que não larga o osso nem a tiro de cacete e do Tony das Farturas - como lhe chama o camarada Valdemar que lá das antípodas não perde pitada do que aqui se passa - que vê os seus camaradas do partido e do governo fazerem asneira da grossa. Parece que os dois andam à porfia para ver quem é mais contestado e quem mais dura no poleiro.
Assim não dá, tenho que descobrir onde me refugiar para não assistir a este lavar de roupa suja. É que já não há paciência para tanta falta de qualidade nisto das notícias. Sempre que ligo a televisão, aparece-me alguém a pedir para ligar para o 760 qualquer coisa, ou então um grupo de encarapuçados a correr em direcção à Academia do Sporting. Acontece para aí durante umas 12 horas por dia, em cada canal. Salva-se a RTP2 que está sempre a transmitir qualquer coisa que não interessa a ninguém.
O meu refúgio tem sido a internet, onde só leio o que quero, mas a coisa está a tornar-se difícil, pois começa a ser uma réplica fiel do que passa na televisão. Vingo-me desligando a televisão e passando menos tempo no computador, mas só me sobra um recurso, o SUDOKU. Não sabem o que isso é? É um passatempo importado do Japão que serve para manter os nossos neurónios ocupados e devidamente alinhados, mas tem também um problema, se é fácil demais não dá pica e se é difícil demais o jogador perde a paciência e vai espreitar as soluções.
- Deixa-te disso, lê antes um livro!
Eu lia, se tivesse os meus olhos da juventude. Agora, o meu limite na leitura são, talvez, 10 páginas e se a luz for boa e o tamanho da letra não for pequeno demais. E o pior de tudo é que esta linha de pensamento leva-me a fazer um balanço que me deixa ainda mais desanimado. Não são apenas os olhos que perderam muito da sua faculdade, são muitas outras coisas que se foram apagando, muitos órgãos que já não funcionam como deviam, muitos músculos que não obedecem ao comando do nosso cérebro. A conclusão só pode ser uma, a nossa cabeça gosta da ideia de continuar a viver, mas o nosso corpo arrasta-se penosamente e só pensa em desistir.
Este último pensamento leva-me de regresso a Lourenço Marques, início do ano de 1963. O 2º Pelotão da Companhia 2 de Fuzileiros recebeu ordem para se pôr a caminho de Vila Luísa, num exercício que servia apenas para manter a forma física. Praticamente no pino do verão africano, o calor era de rachar e os 6 kms/hora, impostos pelas regras, depressa começaram a fazer mossa entre o pessoal. Quem mais sofria era o comandante do pelotão, um jovem oficial da RN que pesava uns bons 20 kgs acima do peso ideal e rezava a todos os santos para que o livrassem daquele martírio. Depois de duas horas de sofrimento e apenas 10 kms vencidos, veio a ordem para encostar à berma e descansar um pouco. O pessoal começou a descalçar as botas, a tirar as meias e pôr à vista enormes bolhas de água que em alguns casos já aparecia avermelhada. E o pior de todos, sem sombra de dúvida era o oficial, o que nos valeu um contacto para a base a pedir uma camioneta para nos levar a todos de regresso a casa.
Desculpem lá, perdi-me completamente daquilo que era a razão desta minha publicação. O nosso pensamento é como um prato de tremoços, pega-se no primeiro e nunca mais se pára.