Sem muito com que ocupar a mente, os meus pensamentos voam ao sabor da chuva e do vento que sinto estarem na hora de parar e darem lugar à Primavera que é tão linda, sorridente e cheia de flores. Este mês de Abril de 2022 - que nos trouxe a chuva que não veio no inverno e nos salvou da seca - encontra-me na Póvoa do Mar com 78 anos cansados, mas ainda pronto para aguentar mais umas curvas. O que poderia tornar este Abril diferente seria uma vitória do Benfica, logo à noite, no estádio do Liverpool, coisa muito difícil, mas não impossível.
São 78 Abriles (?) que já vivi e dei comigo a pensar se seria capaz de contar a história de cada um deles. Do primeiro, em 1944, não tenho qualquer memória, mas sei qual era a minha prioridade, agarrar-me à mama da minha mãe, sempre que sentia fome. O primeiro Abril que me ficou na memória foi o de 1950, sentado na minha carteira da escola da Professora D. Josefina e ao lado do Licínio (da Aldeia) meu colega de carteira.
O Abril de 1959 também foi um marco importante na minha vida, pois chegava ao fim uma luta infernal que travava com os meus superiores educativos e me levaria à saída do internato, onde passara os últimos 4 anos. Visto agora, ao fim de tantos anos, foi uma asneira que paguei cara, mas quem não faz asneiras com 15 anos de idade?
Três anos depois, em 1962, rompia as solas das «Botas de Atanado» a bater os tacões, aprender a marchar e a marcar passo. Dois sargentos, desse tempo, foram a minha referência, o gigante Trindade que entrava pela caserna adentro a gritar «enrola a manta», ainda o clarim não tinha acabado de tocar a Alvorada e o Bicho que eu achei bom, mas parece que perdeu qualidade, depois de receber os galões de oficial. Morreu há poucos meses, Deus o tenha em bom lugar.
Em 1965 e 1968, voltei a passar o mês de Abril na Escola de Fuzileiros, após o egresso das duas comissões que fiz, em Moçambique. Em 1969 já estava casado e à espera de ser pai. Em 1970 estava à espera dos papeis para seguir para a Alemanha, numa curta experiência como emigrante. Uns dias antes de partir, no último dia desse mês, faleceu a minha avó Maria que foi quem, verdadeiramente, me criou, uma vez que a minha mãe tinha muito mais com que se preocupar. Rezo a Deus para que a guarde.
Depois disso, a vida entrou numa espiral que me fez esquecer de contar os meses e preocupar com outras coisas. A carreira profissional foi uma luta sem quartel, com muita gente a querer subir pisando na cara dos outros. Para minha felicidade também encontrei alguns amigos que me ajudaram a lutar e vencer as adversidades. Recordo apenas o Abril de 2003 que foi o meu último de trabalho na Maconde. Eu já me tinha reformado, no anterior mês de Setembro, e tinha um acordo com o patrão para trabalhar, enquanto ele achasse que lhe fazia falta. No feriado do 1º de Maio, Dia do Trabalhador, deve ter pensado que eu já não merecia trabalhar, pois ao entrar, na manhã seguinte, veio ter comigo e mandou-me para casa.
E tu, meu caro leitor, que fizeste em todos os Abriles que já viveste?