No colégio que frequentei até aos meus 15 anos a disciplina era aplicada por um Prefeito, assim uma espécie de manda-chuva eleito pelo Reitor para meter a canalha na ordem. A palavra canalha não deve ser entendida em sentido pejorativo, eu uso-a como sinónimo de miudagem e nós sabemos como a miudagem é rebelde e precisa de quem tome conta dela.
E havia outra figura que tinha a sua importância na hierarquia do colégio, o Padre Espiritual. Era assim nas instituições lideradas por Jesuítas, o primeiro tratava do corpo, por vezes recorrendo à chapada para meter na ordem os mais mal comportados, enquanto o outro tratava da alma usando os conselhos, as rezas e as penitências, como ferramenta.
No dia em que abordar este tema nas minhas memórias, isso dará um capítulo de 10 páginas, hoje lembrei-me de abordar esta questão, por causa da problemática dos padres pedófilos que usam e abusam da sua posição para encontrar as vítimas para o seu desvario.
Do 1º ao 3º ano da minha vida de estudante o Prefeito era um padre (já falecido) duro como o granito e ele cedo percebeu que eu era mais teimoso que ele e fazia sempre o contrário daquilo que ele gostava ou pretendia que eu fizesse. Isto quer dizer que andámos 3 anos em guerra um com o outro e levei muito castigo que julguei imerecido, mas nunca arrepiei caminho, ele tinha a autoridade do lado dele e eu estava a construir a minha personalidade. Por bem faziam de mim o que quisessem, por mal nunca me conseguiriam dobrar, obrigaram-me a ir por esse caminho e assim continuei pela vida fora. Na Marinha aconteceu quase a mesma coisa, na primeira Companhia em que segui para Moçambique era o menino querido do comandante e era sempre chamado para quaisquer trabalhos que requeriam alguma autonomia de capacidade de decisão para evitar andar sempre a perguntar: - quer assim ou com mais molho? Na segunda Companhia fui logo metido na lista negra, pelo 2º comandante, por ter feito uma observação que eu considerava ser a mais lógica. Ele poderia ter-se rido na minha cara e seguido em frente, mas preferiu hostilizar-me, durante 24 meses, até me meter na prisão e obrigar a abandonar a Marinha. Talvez isso tenha concorrido - Deus escreve direito por linhas tortas - para eu ter tido uma vida de maior sucesso do que chegar a sargento ou oficial da Marinha.
Mas, voltando à história dos padres que é o objecto desta minha publicação, para minha grande surpresa, o padre que era Prefeito passou a Espiritual, no meu 4º ano de colégio. Estão a ver o quadro? Era assim uma espécie de lobo encarregado de tomar conta do rebanho de carneirinhos que começavam a ter as suas hormonas em ebulição. A funçao do Padre Espiritual era estudar o carácter de cada aluno e tentar guiá-lo para o caminho certo se e quando sentissem que ele andava por caminhos errados.
Era, portanto, comum que cada aluno fosse chamado ao Padre Espiritual, de vez em quando, para aferir o estado do seu espírito, ou por haver alguém que se tivesse queixado das atitudes atitudes no relacionamento com colegas ou superiores. Eu estava habituado a isso, já conhecia a rotina.
Fiquei foi admirado, quando o novo Prefeito chamou por mim, me mandou sentar no seu joelho esquerdo e começou um questionário que ele devia ter preparado para os alunos mais crescidos e mais rebeldes que era o meu caso. Eu entrara no colégio, já a caminho dos 12 anos e era natural que começasse a olhar para as raparigas, sempre que uma me passava em frente dos olhos. As perguntas eram sempre de cariz sexual, tentando descobrir se, como e quando sentíamos algum impulso "pecaminoso". Tocar no sexo ou falar dele era um grande pecado e sujeito a grandes penitências. Estão a ver o filme comigo sentado no joelho do padre e ele a perguntar-me - mesmo que por meias palavras - se eu já sentia algum impulso sexual.
Pois, foi isso que me fez pensar se eu, algum dia, durante esse meu último ano no colégio, tinha estado em risco de me tornar em mais uma vítima dessa cambada de animais pedófilos. Felizmente, para mim, chegaram à conclusão que eu ia por mau caminho e recomendaram a minha expulsão, no longínquo mês de Maio de 1959. Talvez devesse ficar grato ao homem que teve essa ideia em vez de o criticar!
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